FOLHA PEQUENA

As Infâncias do Candomblé

Capa de Livro: FOLHA PEQUENA

Estranho. Não precisamos nos esforçar para compreendermos e aceitarmos a participação de crianças nas demais religiões, mas, sobre suas presenças no candomblé, como prova o testemunho capturado por Robson Marques nesse livro, dedicamos um tempo precioso para fazer emergir uma estranha justificativa sobre o direito à infância nos terreiros.

Como foi a história da escravidão negra, de apagamento das almas africanas na sua condição de sujeitos humanos, essa perversa forma de destruir a vida dos diferentes, a partir de uma crença supremacista, está na gênese dessa negação do direito das crianças aos terreiros e dos ter-
reiros às crianças.

Quando é que nos sentimos apagados? - Quando, no âmago de nossas almas, não há mais criança. Matamo-nos, real e simbolicamente, quando negamos o direito da nossa criança existir. Para termos vida, é preciso que dentro de nós, nos nossos espíritos, habite sempre uma criança.
Alguém já perguntou o que sentiram as crianças quando viram seus pais reduzidos à condição de animais na África colonial pelas mãos sanguinárias dos colonizadores? Aquelas quenasceram nos porões fétidos dos navios negreiros? As abusadas pelos senhores? O que vimos falar sobre a infância negra?

A tinta preta apagou-se sobre o papel branco da história. Candomblé é coisa de negro. Veio com os negros. Mas, quisera a história que a humanidade racista não conseguisse, sequer, arranhar a força da ancestralidade africana, hoje viva, presente nos terreiros.
Escreve Robson que também os filhos, as crianças, são trazidos a estas casas sagradas, geralmente por pais ou familiares. Mas há também, aquelas trazidas pela ancestralidade, diria mesmo, escolhida por elas. Nesse particular, apesar de crianças na vida, são adultos no santo.
Fato é que, como dito, A CRIANÇA TEM DIREITO AO TERREIRO E O TERREIRO TEM DIREITO À CRIANÇA. Mas a racionalidade supremacista que ainda impera na sociedade, tem buscado negar essas duas formas de pertencimento: a criança ao terreiro e o terreiro à criança.

Como brilhantemente capturou Robson nas narrativas de Babalorixás, Yalorixás, pais e das próprias crianças, diferentes formas de atuação, inclusive mediadas pelos aparelhos do Estado, tem feito um esforço para nos fazer crer que os terreiros não são espaços adequados às crianças. É no terreiro que as crianças brincam, eles não sabem?!
Deveria ser desnecessário esta exegese, mas, enquanto estivermos sobre o comando dos enraizamentos supremacistas, racistas, e de uma mentalidade colonialista-essencialista-judaico-cristã, testemunhos como os que aqui foram capturados por Robson, precisam emergir do s oceanos profundos dos nossos silenciamentos.

Conhecendo Robson desde criança, vivendo com ele como irmão-filho, a quem amo de amor-grande-imenso-infinito-eterno, minha criança celebra na sua criança todas as crianças do mundo. Aqui, ele fez uma opção iluminada de proteger o direito das crianças dos terreiros de candomblé
do nosso Sertão Infantil!

Juracy Marques

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